A importância social da construção se deve, em parte, a grande absorção da mão de obra do setor e o poder de reprodução de empregos diretos e indiretos. A reprodução do trabalho na construção civil não é realizada por meio de uma seleção e treinamento formal, e com isto, as empresas acabam submetendo suas regras de comunicação e estrutura organizacional aos hábitos provenientes da cultura de seus operários - cultura essa, ainda ligada à sua origem social, o campo, de onde vieram os primeiros migrantes - e pactuam com a hierarquia de poder estabelecido no interior da estrutura de ofícios, centralizada pelo mestre-de-obras.
Vargas(1984) ratifica esta afirmação: "apesar dos trabalhadores serem formados no local de trabalho, nos canteiros de obra, a empresa interfere muito pouco nesta formação, somente dando seu aval a essa estrutura, com a admissão dos trabalhadores que se submetem à disciplina e às condições de trabalho subjacentes."
A construção civil é um setor em que a cultura operária está presente na socialização da força de trabalho e na estrutura de ofício difundida nos diversos canteiros. Dentro dessa estrutura é que as empresas têm procurado estabelecer a sua lógica empresarial.
Deste modo, acaba criando no meio empresarial, onde o conceito de qualificação está muito preso à educação formal, a idéia de que o trabalhador da construção civil é desqualificado. Pelo fato da construção civil ser uma das primeiras atividades urbanas dos migrantes internos, este setor passa a ser, muitas vezes, o portão de entrada no mercado urbano de trabalho.
Segundo Mascaró (1981) a relação entre operários especializados e não especializados é de quase 1/3. E, como a forma predominante de qualificação continua ocorrendo no próprio ambiente de trabalho, o tempo mínimo de aprendizado seria de 5 a 7 anos, com base na média das idades dos operários no ingresso nas diferentes categorias.
Apesar do longo período de aprendizado, nem todos os operários conseguem qualificação para atender a demanda das obras. Dos três operários não qualificados, somente um deles terá possibilidade de aprender o ofício, os outros dois ou permanecem não qualificados ou saem da atividade (Mascaró, 1981).
Farah (1992) descreve parte da evolução deste aprendizado no Brasil: os trabalhadores livres, os quais dirigiam freqüentemente o trabalho pesado realizado pelos escravos, sendo detentores de ofícios ligados à construção organizaram-se em corporações até o início do século XIX. Nestas corporações identifica-se uma sistemática de mobilidade ocupacional, associada à aprendizagem de um ofício. Nas tendas dos mestres, os aprendizes recebiam os ensinamentos da atividade de construção, em troca da prestação de serviços. A formação se dava através da transmissão de conhecimentos empíricos pelos artesãos detentores de ofícios - carpinteiros, pedreiros, ferreiros - no exercício do próprio trabalho. Após um período de aprendizagem e de avaliação, o aprendiz passava a obreiro ou oficial assalariado, ficando nesta posição por um período de dois anos. Era então submetido a um exame, e uma vez aprovado, considerado mestre.
Atualmente, predomina ainda, na formação do trabalhador, o aprendizado estabelecido na relação direta entre oficial e ajudante, - ou seja, a habilidade do trabalhador é adquirido no próprio canteiro de obras - embora tenha havido iniciativas no sentido de formalizar o processo de aquisição do saber requerido pela atividade de construção. A carreira começa pelo posto de servente, passando depois de ajudante a oficial. Contudo, diferentemente das corporações de artesãos da Idade Média, a passagem de ajudante a oficial não é assegurada depois de um tempo de aprendizado. Além do conhecimento da profissão, é necessário possuir as ferramentas essenciais ao seu trabalho.
Para Lima, o processo de formação ocorre através da iniciação e da colaboração direta na execução das tarefas, há nesse sistema uma transmissão por empatia, por impregnação dos conhecimentos produtivos e da bagagem gestual, do trabalhador de ofício para seu ajudante (Lima apud Farah,1988).
Frente ao desafio colocado pela variabilidade, característica da atividade de construção, os operários necessitam, além do aprendizado dos modos operativos, desenvolver a capacidade para o exercício da iniciativa. Na vivência do canteiro, ele também aprende a se submeter a uma estrutura hierárquica rígida. Por outro lado, aprende também a exercer controle sobre o trabalho de outros, função assumida, em níveis crescentes, pelos oficiais, pelos encarregados de ofícios e por último, pelo mestre.
Em virtude da complexidade e da diversidade dos conhecimentos que formam o repertório profissional dos ofícios, o aprendizado é um processo de duração prolongada. O aperfeiçoamento do trabalhador é também um processo extensivo. Por toda sua vida profissional, o trabalhador de ofício desenvolve a sua habilidade; sendo a sua experiência proporcional ao tempo de serviço na profissão (Farah,1988).
Além destas particularidades, em relação ao operário da indústria da construção civil, o setor se diferencia dos demais tanto pelo seu produto, quanto pelo processo produtivo utilizado. No que se refere ao produto, eles são sempre diferentes, cada obra é única, caracterizado como: imóvel; de grande porte e alto valor monetário (Trajano apud Vidal, 1987). Outras características distintivas da construção habitacional em relação às demais indústrias é o nível de precisão e de detalhamento do projeto de engenharia e de arquitetura. O material de base na construção (concreto, cerâmica e madeira) não possui, pela tecnologia disponível, meios de produção que alcancem o grau de precisão dos metais e dos plásticos que suprem as outras indústrias, devido ao porte de seu produto e a uma menor exigência nos seus limites dimensionais (Vargas,1984).
Quanto ao seu processo produtivo, apresenta locais de trabalho variados e temporários (os canteiros possuem arranjos diferentes, peculiares a cada obra) e se apoia numa produção quase sempre com bases artesanais, que tendem a ser parceladas em função das diferentes fases da obra.
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